segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A função da pena - uma aula de verdade...

Professor – Caros alunos, hoje vamos discutir sobre a função da pena no direito penal. - Ajeita os óculos, arruma o terno, dá uma sonora e professora respirada.

Professor – Bom, como todo mundo já deve ter estudado, a pena tem por objetivo ressocializar o cidadão em conflito com a lei.

Aluno – Professor, posso fazer uma pergunta?

Professor – Já?

Aluno – ?

Professor – Tudo bem, diga.

Aluno – Achei que a pena era para punir...

Professor – Meu caro, os longos anos de evolução das teorias criminológicas estudaram o comportamento humano e concluíram que a pena deve servir para ressocializar.

Aluno – Deve servir ou serve? Ela é ressocializadora ou deve ser ressocializadora?

Professor – Hum... Ela é ressocializadora.

Aluno – Legal. E esses caras aí, que fizeram estes estudos, como eles pesquisaram?

Professor – Ah, com muitos livros, muito estudo, durante anos!

Aluno – Legal. E eles fizeram pesquisa de campo? Entrevistaram as pessoas? Ouviram vítimas e réus?

Professor – Acho que não, por quê?

Aluno – Sei lá, é que eu já sou formado em medicina, e lá a gente só diz que um remédio tem um determinado efeito se já foi testado e deu resultado mesmo. Queria saber se já foi constatado de algum modo isso, a pena ressocializa?

Professor – Acho que nunca fizeram essa pesquisa. Seria uma boa tese de doutorado, mas como você está apenas na graduação, não deve se arriscar a discutir isso. Nem no mestrado, onde você não pode ter ideias novas. Só longos anos de estudo num doutorado ou num pós-doutorado para chegar nessa conclusão. Bom, retornando...

Aluno – Legal. No doutorado tem pesquisa de campo?

Professor – Nunca vi. Só pesquisa bibliográfica.

Aluno – Por quê? Como é que se descobre que a pena serve melhor para isso ou para aquilo se não analisam dados reais? É mais fácil só ficar na biblioteca?

Professor – Não sei, pode ser.

Aluno – Ouvi falar da teoria das janelas quebradas. Nos EUA foi feita uma pesquisa de campo...

Professor – Essa teoria já é considerada ultrapassada.

Aluno – Ah, já fizeram outras pesquisas que infirmaram a hipótese? Conseguiram outros dados?

Professor – Que eu saiba não... Acho que a literatura da criminologia negou validade.

Aluno – Assim, só por literatura? Só por argumentação? Nenhum teste, nada?

Professor – Err... acho que não...

Aluno – Engraçado, né professor. A teoria da relatividade de Einstein só foi aceita quando foi demonstrada. Em Direito as teorias não precisam ser demonstradas?

Professor – Olha, grandes autores, de renome internacional, reforçam o argumento de que a pena é deve ter, ou tem, sei lá, tanto faz, um caráter ressocializador.

Aluno – Profe, gostei da aula. No direito, então, não se testam as teorias, descreve-se o objeto por aquilo que queremos que ele seja e não por aquilo que ele é, e usamos o argumento de autoridade como principal elemento de convencimento. É um pouco mais difícil que na medicina, mas estou gostando. Obrigado.



Nota: Qualquer semelhança com certas conclusões darwinistas não é mera coincidência...
[Michelson Borges]